crítica feminista

Doses de Saber

Resenhas e Resumos

Isaias Carvalho, 2010

A crítica feminista na mira da crítica

Rita Terezinha Schmidt escreve “A crítica feminista na mira da crítica” (In: ALMEIDA, S. R. G. Ilha do desterro: a journal of English language, literatures in English and cultural studies. Florianópolis: Editora da UFSC. n. 42, jan-jun, 2002), com o obetivo Geral de problematizar colocações contidas na introdução e em dois ensaios contidas na Antologia crítica: Brazilian feminisms (1999), no campo dos estudos literários feministas. A autora comenta a questão da importação de teorias e da crítica feminista no contexto nacional, pontuando falhas na introdução, da crítica inglesa Judith Still, e nestes ensaios: Theory and pedagogy in the Brazilian Northeast, da crítica norte-americana Darlene Sadlier, e Importing feminist criticism, da crítica brasileira Maria Eliza Cevasco.

Na verdade, Schmidt faz um diálogo crítico entre tensão e homenagem a esses textos que aborda. Homenagem, por destacá-los e lhes dar visibilidade. A tensão se estabelece em sua crítica às afirmações contidas nesses três textos de que a teoria feminista brasileira é caracterizada pelas pechas de assimilação, imitação, importação acrítica de pressupostos, alinhamento à tradição liberal da democracia racial brasileira, cegueira em relação às questões de raça (etnia) e classe e seu caráter deficitário e colonizado.

Para Schmidt, a reflexão sobre a existência de uma crítica feminista no Brasil deve partir de uma “visada histórica dos modos e dos lugares de sua produção”. Alega que as teorias importadas (não apenas no campo dos estudos literários) não foram recebidas acriticamente. Foi estabelecido um clima de tensão e diálogo, a partir dos anos 70, para se repensar as bases epistemológicas e para formar a identidade literária nacional em termos distintos em relação à matriz etnocêntrica, mesmo que não apague as marcas ideológicas de seus contextos originais de enunciação. Ou seja, um processo de aclimatação teórica.

Também são abordados os caminhos da crítica feminista no Brasil, a partir do contexto universtário dos anos 80, em que seu status acadêmico ainda é rebaixado: estigma de modelo estrangeiro ou bandeira de moda. Cita fartametne Jonathan Culler – On deconstruction (1982) –, que faz elogios à crítica feminista. Questiona a hegemonia do sujeito enunciador interventor na autoridade epistêmica do falocentrismo marginalizador das mulheres. Aponta duas linhas críticas feministas: a anglo-americana e a francesa com um denominador comum: “a necessidade de historicizar significados cristalizados pela tradição, desmistificando o teor hegemônico da história literária e sua violência epistemológica na construção do não-lugar das mulheres na história e na cultura” (p. 109). Anuncia a virada historiográfica, pela qual é feito o resgate de obras femininas – textos silenciados nas histórias literárias e suas várias implicações.

De modo específico, Schmidt faz as seguintes críticas à introdução de Judith Still: 1) o uso do termo “feminismos”: feminismo e crítica feminista não são termos sinônimos; 2) as poucas referências a vários trabalhos e eventos no campo da crítica feminista no Brasil, o que demonstraria pouca pesquisa (ou seja, uma acusação). Já sobre o artigo Importing feminist criticism, da crítica brasileira Maria Eliza Cevasco, faz as instigantes colocações: a mistificação das condições sócio-históricas dos contextos de origem das teorias importadas; o equívoco do uso do termo pluaralistic fantasy land para o contexto brasileiro, pois Cevasco desconheceria o caminhar do movimento em direção à desmistificação e desessencialização da categoria “mulher” pelos influxos das minorias de cor, raça (etnia), classe e terceiro mundo. Também acusa Cevasco de parca leitura, indicando que o corpus foi composto a partir de experiência pessoal (insuficiente) e não cita textos críticos brasileiros. Finalmente, sobre o artigo Theory and pedagogy in the Brazilian Northeast, da crítica norte-americana Darlene Sadlier, indica como seus pressupostos contradizem Cevasco em vários pontos. Também aponta a ausência das categorias de classe e raça (etnia) –, talvez como resultado da influência do pós-estruturalismo, que equivocadamente dá demasiada ênfase à linguagem. Acusa essa autora de conclusões a priori e generalizações, não apontando os sujeitos da prática teórica que acusa.

Trata-se, portanto, de um texto farto da postura crítica bem-vinda na contemporaneidade: críticas das críticas, em diálogos sempre tensos, mas de relevância, não apenas para as feministas, mas para todos os estudiosos e interessados no viés cultural da análise da literatura, das artes e da sociedade.

SCHMIDT, Rita Terezinha. A crítica feminista na mira da crítica. In: ALMEIDA, Sandra Regina Goulart. Ilha do desterro: a journal of English language, literatures in English and cultural studies. Florianópolis: Editora da UFSC, 1979. n. 42, jan-jun, 2002.

© 2009 isaiasfcarvalho@gmail.com

Itabuna/Ilhéus, Bahia, Brasil