II estes

Ilustrações e Capa

Wellington Mendes

Planejamento Gráfico

João Soares

Revisão

Conceição Paranhos

Rita Aragão Matos

Colaboração

Dilson Midlej

Luciano Paiva Nóbrega

Edição do Autor

Salvador, 1997

Estes

Isaias Carvalho (1997)

II

Estes

Este

Há homens que nasceram para as mulheres,

há os que nasceram para os homens,

há outros tantos para tantas

vidas vãs.

Há este que nasceu quando,

para dormir manhãs

e ser homem enquanto descansam

os que nasceram para o labor

(os de mente sã).

Este que não se inclina,

na relva sórdida dos feitos humanos,

a qualquer fazimento,

na incógnita paisagem interior,

a qualquer sentimento banal,

na inóspita visão do eterno cósmico,

a qualquer alento.

Na concretude espúria dos objetos,

apenas o nada

em marcha,

desatento.

Anjo novo

Vampiros da metrópole,

eis um anjo

novo a seu dispor!

Límpido,

ao menos em aparência,

até que sintam

o que o sustenta.

Conversão inversa.

Fuligem Poética

As águas

Anacrônico,

nasci tarde ou cedo.

Falo de vagas idéias

ardidas de medo,

de rimas mesmas

- a forca é a última rima -

para completar o poema da vida,

e que não venho

para cantar minhas raízes,

ao certo, não sei a que venho.

Escrevo porque dôo,

como tantos doem.

Escrevo como se desenhasse

colméia de versos

e curvas.

Porque as águas ainda estão turvas,

desagúo.

As flores

A Charles Baudelaire

Espírito

que dorme nos teatros e cafés,

vê, além das conversas triviais

e espetáculos banais,

as tolas alegrias dos boêmios.

Esquecido,

porque dormi durante o show,

mas sonhei de aplausos

e flores.

(As mesmas que enfeitarão meu túmulo).

Nada

A Cecília Meireles

Meu nome,

todos os abortos

e óvulos estéreis.

Meu nome não me nomeia,

pois me mato antes, sempre -

forma estendida sobre um abismo

entre o belo extremo

e o execrável.

Não moro em meu nome,

mas onde se abraçam sopros de vento

indistintos,

onde se choram gotas de chuva

por entre rochas faciais anônimas.

Meu nome é um momento,

e momentos morrem em ato,

outros em esquecimento.

Meu nome é nada.

Arado

Ainda ara em mim

o arado das terras de menino,

da mãe que orava.

Ainda ora.

Torrões secos

ainda secam

meu ser que erra.

Tantas hipóteses.

Tantos banhos e sonhos.

Ainda ara em mim

o arado das terras de menino,

mas ara, agora, o destino -

sulcos mais profundos,

nos quais me semeio para o mundo.

Liberdade

Nasci livro,

livre, limpo,

aberto,

concreto, barroco,

outros.

Bíblia, biblioteca,

estante,

instante, silêncio,

ler, lido.

Morro livro.

Livre?

Tercetos

Confrange-me,

em ti,

ver minha alma repousar.

Invejo-te,

pois que vestes minha beleza,

a mim negada.

Tortura-me

minha abnegada vontade,

que em ti se revela.

Dói-me

todo o meu gozo,

que em ti se realiza.

Encho-me de horror

por ser em ti, em ti só,

que sou.

Estes

(in)versos