literariedade

Doses de Saber

Resenhas e Resumos

Isaias Carvalho, 2010

Literariedade: margens entre o literário e o não-literário

Para Antoine Compagnon (1999, p. 32-33), todo julgamento de valor implica um ato de exclusão. Assim, estabelecer a fronteira entre o literário e o não literário depende do contexto histórico e geográfico. Afirmar que um texto é literário coloca sempre outro que não o é. Obviamente, apesar de não ser totalmente aplicável, é mais realizável a separação entre o que é e o que não é jurídico, por exemplo. E é pertinente enfatizar que as margens entre o literário e outros campos do saber são rasuradas e reconstruídas.

Informa-nos mais uma vez Antoine Compagnon (1999, p. 40-4) que foram os formalistas russos que delinearam uma utilização especificamente literária para a língua. Desse modo, a característica distintiva do texto literário é a literariedade, ou seja, o que faz determinada obra uma obra literária. Mas Compagnon afasta o conceito pela dificuldade de sua aplicação, pois “não existem elementos lingüísticos exclusivamente literários” (COMPAGNON, 1999, p.42). Para ele, a desfamiliarização trazida pela literatura não é resultado

da utilização de elementos linguísticos próprios, mas de uma organização diferente (por exemplo, mais densa, mais coerente, mais complexa) dos mesmos materiais lingüísticos cotidianos. Em outras palavras, não é a metáfora em si que faria a literariedade de um texto, mas uma rede metafórica mais cerrada, a qual relegaria a segundo plano as outras funções lingüísticas (COMPAGNON, 1999, p. 43).

É por isso que o caráter provisório típico da contemporaneidade, tanto na literatura quanto em outras áreas, parece ter tudo para durar, pois não há essência da literatura ou essência de outros saberes. São realidades complexas, heterogêneas e mutáveis.

Referência

COMPAGNON, Antoine. O demônio da teoria; literatura e senso comum. Trad. Cleonice Paes Barreto Mourão.Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999.

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Itabuna/Ilhéus, Bahia, Brasil