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Romance das mães que choram
vou contar em verso branco
Para honrar todas as mães
Que já choraram nesta vida.
Quem mais ama é quem mais sofre
E mais que a Mãe ninguém ama.
É por isso que o seu pranto
É maior que o mar imenso.
O seu pranto hei-de guardar
em meu coração de filho.
Nascemos para sofrer
E o pranto alivia a dor!
Certa mãe que eu conheci
Ao filho do seu amor
Esperou os meses todos.
E dizia a toda a gente:
Há-de ter olhos azuis,
Há-de ser branco de neve,
Nascerá rindo para mim.
Foi uma filha ceguinha
E escura como a dor
Que veio ao mundo a chorar.
E depois de baptizada
A menina foi-se embora
Abrir os olhos no céu.
Só a mãe ficou chorando...
Está esperando outra vez...
Já não quer olhos azuis
E nem pensar na alvura,
Menos ainda em sorrisos,
O filho do meu amor
Há-de ser como Deus queira,
silenciava consigo...
Desabrochou outra flor,
Amadureceu outro fruto...
Um menino! E que perfeito.
É moreno, a cor do pai...
Olhos verdes, esperança!
E o que há-de ser, o meu filho?
Embala, embala o menino,
Que o futuro está no berço!
Lavrador ou mestre-escola?
Há-de ser juiz? Soldado?
Soldado não, que é de guerra
E eu não quero que ele morra!
O menino o que há-de ser?
Senhor doutor p'ra curar
Doenças do mundo vário?
Venderá chita ao balcão?
Embarcará para a aventura?
Ou será padre de missa?
O menino o que há-de ser?
E os anos foram pesando
Na fronte da mãe e filho.
A ela, nevou-a o pranto
E o menino...às sortes ido...
É verdade, o seu menino
Vai para o Castelo apurado
E o pranto redobra agora:
É ribeira caudalosa
A tombar de face a face.
O menino despediu-se...
Leva a saudade retida
No tal sorriso sonhado...
Os olhos são menos verdes.
Está cortado o cabelo,
E no corpo vai a farda.
Assentou praça no castelo.
Tu não chores minha mãe
Meus irmãos te alegrarão.
Hei-de voltar qualquer dia.
Já sou grande e já sou forte.
Quero lutar e vencer
Por amor da nossa terra.
Dizes bem meu rico filho
Eu te ofereço generosa
Mas ninguém pode evitar
Que chore a tua partida...
Teus irmãos ficam comigo,
Mas teu lugar é vazio...
Ficas no meu coração...
É a saudade que chora.
Eu espero que tu voltes
Mas tenho medo da guerra.
E os homens só pensam nela.
E os soldados mais novos
São os primeiros que morrem...
E lá se foi o menino
Marcou e passo e continências
Fez ao senhor oficial.
foi à carreira de tiro
E atirou balas ao alvo...
Meteu guarda aos portões
Fez rondas e diligências.
E quando, tempo cumprido,
Com licenças de ir a casa
E namoro já firmado
(Que ao amor ninguém resiste).
Quando a mãe já não chorava
Contente do seu regresso,
Veio uma ordem de fora:
Atacaram nossa terra
É preciso defendê-la.
Soldados dizei ao mundo
Que sois dignos dos avós
Que fizeram nossa glória.
Vosso destino é de heróis,
Vossa vida é martírio.
Vamos! Avante ! Coragem
A Pátria pede e espera!
E logo um coro de vozes,
Tão quente como o braseiro
Responderam, fieis, nobres
Tal como os grandes de antanho
Presentes! A Pátria chama!
Vamos ! Nós somos heróis
do mar! Avante ! Marchar!
E cornetas e tambores
Mobilizaram as almas..
E veio o barco e partiram
E o menino também foi.
Ficou a noiva e o... sonho
E ficou chorando mãe...
ai, meu filho, eu te ofereço.
Mas irás para a vitória
Ungido no meu chorar.
Que Deus te leve por bem
E te traga brevemente...
Não te esqueças de rezar
E também de me escrever
Minha mão até à volta.
Hei-de escrever e rezar.
Hei-de lutar e vencer.
Terás orgulho de mim
O teu menino maior
E ficou a mãe chorando
Junto à porta sem alento.
Metade do coração
Ia com ele p'ra guerra...
Perdida a mão pelo ar
Um adeus guiou-lhe a voz
e caiu desfalecida...
Já passaram muitos meses
Mas o pranto não passou.
Vieram cartas e cartas...
Minha mãe não desanime.
Hei-de voltar muito em breve.
Mas a mãe não se calou.
Chora ainda saudosa...
E pensa em tanto perigo:
Uma bala traiçoeira...
Um abismo, o frio, a chuva
O calor, a febre, a fome...
Inda se eu lá estivera...
Mas sózinho! Ai o meu filho!
E chorava saudosa!
Que parecia em verdade,
Tal e qual nossa senhora
Quando seu filho mataram.
Mas, um dia, ai que delírio!
Veio a notícia almejada:
Minha mãe vou regressar
Que a guerra já se acabou.
Nunca mais hás-de chorar...
Mas, afinal, vejam lá,
Rindo e chorando ficou
aquela mãe do menino!
Que a alegria também chora.
Ela chora de contente.
O menino ia voltar
E voltou o seu menino.
E chorou no seu encontro.
Foram de pranto os seus beijos.
E molhado o seu abraço.
E como a vida não pára
O menino não parou.
Meses depois, era noivo
A casar-se na Igreja.
E a mãe não se conteve
Chorou de novo outra vez.
À despedida. Ao adeus.
E chora ainda que eu sei
quando diz a toda a gente
Sou feliz, ele é feliz
Mas a vida é mesmo assim..
Este mundo é vale de lágrimas
E quem mais chora é a mãe.
Vieram-me dizer que certa mãe
Que tem o coração empedernido
Deitou fora de casa um filho seu.
Não quero mais saber que sejas meu,
A rua é teu abrigo apetecido.
E companhia a sombra de ninguém.
Vai-te embora depressa, mais gritava
E a sua voz de mãe desnaturada
Apostrofando pragas, parecia
O rugir duma fera solta e brava
Que no seu furor não respeita nada
Tudo ferindo com mortal perfídia...
Na mesa do comer está vazio
O prato e o lugar que ele deixou
Com lágrimas nos olhos, sem amparo...
Um coração de mãe, assim quem viu?
Até o pai também o expulsou
Fazendo o mesmo os irmãos!
Que caso raro!
Ainda se ele fora outro pródigo
Ingrato ou perjuro ou malfeitor,
Um revoltado ateu, talvez perdido,
Merecia pesado o seu castigo
Mas não, pois tinha na alma igual amor
A quanto deles tinha perdido.
O pão de esmola está comendo,
E dorme o sono breve dos proscritos
E tantos o odeiam sem razão...
O seu passado, o seu presente, chora
E do futuro ainda mais os fitos
Ninguém pode calar o coração.
Bom ouvinte, já contei
Romance das mães que choram.
Para honrar todas as mães
Que choraram nesta vida...
A vida que é para ti
Feita de prantos e dores
Mas que um dia já sem pranto
Há-de ser eterno gozo.
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créditos: Dionísio Sousa contacto: dionisiomendes@gmail. com