nunca fomos tão felizes/ ECEU - USP RP

DANILLO VILLA + ÉLCIO MIAZAKI +  VICENTE LIMA (INTERMEDIAÇÃO + TEXTO)


Pensei muito a respeito de um formato de texto, principalmente levando em consideração meu papel dentro dessa exposição. Soa próximo ao que seria uma curadoria: uma leitura e um pensar, tanto de possibilidades de diálogos entre os trabalhos, como de qual seria o tom da exposição. Não me vejo como curador ou alguém que esteja curando. Talvez mais como um artista entre os dois, estando nesse processo em outra posição, como um terceiro elemento no diálogo. Trato então este texto da mesma maneira: algo que se junta aos trabalhos.

Nesse sentido, me permito trazer algumas cenas que me vinham à cabeça durante o processo de entendimento desse tom, justamente como elementos possíveis de adicionar ao diálogo e complementar a escrita. (Já adianto que duas das três se tornaram memes e, além de já poderem ser muito conhecidas, estão fora de seus contextos, então as descrevo aqui apenas como cenas isoladas.)

 

1# Craque Neto – "Cê jogô naonde?"

Ex-jogador Neto, ou Craque Neto, em seu programa de esportes na TV, comenta sobre a importância dos estudos e como seus filhos viam isso em relação a ele não os ter completado. Como de costume, os comentários de Neto vão ganhando intensidade na fala e ele segue simulando uma resposta aos filhos: "Ah, mas você não estudou…Mas ocê é craque? Jogô naonde? Podiam fazer uma camisa: jogô naonde? Jogô naonde, filho? Jogô naonde, filha?". E aí segue para a parte que me atenta: de alguma forma, essa fala vai ganhando uma carga amarga, de maneira que pode-se ver algo de sua vida passando nos olhos do craque. Ele sobe a voz, vinda das entranhas, num tom de dor e amargura: "JOGÔ NAONDE, PAI?. JOGÔ NAONDE, MÃE? JOGÔ NAONDE?!" Pausa. Segue para um tom mais leve: "Não estudei. Gostaria de ter estudado…". E finaliza, de peito cheio, empunhando da forma mais sábia sua arma, afirmando: "Mas eu joguei no Maracanã…".

 

2# Uncle Rico (Tio Rico) - Napoleon Dynamite (2004)

Uncle Rico (Tio Rico) sentado na escada de entrada de Kip. Estão comendo. Rico, como de costume, está contando sobre seu passado como jogador de futebol americano no colégio, e seus lançamentos difíceis de acreditar. Logo avista Napoleon se aproximando de bicicleta. "Veja isso". Agarra o bife de carne do prato de Kip e o arremessa, acertando em cheio a cara de Napoleon. Tal conquista o faz entrar em um estado de euforia que coloca seus relatos ainda mais no limite da realidade. "Aposta quanto que consigo jogar uma bola para além daquelas montanhas?! Se tivesse entrado no time, teríamos sido campeões estaduais, sem dúvida alguma…". Diante disso, discorre por diversas possibilidades imaginárias do que poderia ter sido sua carreira como jogador, assim como sua vida amorosa, chegando ao ponto de perguntar a Kip sobre o andamento da humanidade em relação a viagem no tempo, por ele saber sobre "ciberespaço” e coisas assim".

 

3# Tony Garcia no Balanço Geral

Sucintamente, uma apresentação de Tony Garcia (ou Tony "Dr. Edit" Garcia) e Robert-O no programa de TV Balanço Geral. Tony toca seu clássico do Freestyle (ou Funk Melody), "Just Like the Wind", no maior dos playbacks, afinal parece passar pelas teclas com outro critério. Robert-O nos vocais dando tudo de si na dança. Em certo momento, o apresentador do programa sobe ao palco e começa uma coreografia, muito bem executada, imitando um robô.

É esse certo ápice dramático e intenso, um pico incontrolável de algo que vai da angústia à solução. O que é comum é parecer vir da comparação com vivências passadas. São cenas engraçadas que, não à toa, rodam por aí como memes, muito pelos graus dessas performances. Mas me emocionam tais cenas, também pelo cômico nelas, mas principalmente por irem tomando proporções muito fortes e internas, colocando seus atores em um lugar de quase vulnerabilidade, pelo peito aberto da falta de controle.

A combinação do cômico com o trágico dá no melancólico. Talvez seja por aí que os diálogos da exposição andem: uma sobriedade do trabalho de Élcio, mesmo em suas subversões, junto à uma gestualidade intensa a favor de um silêncio nos trabalhos de Danillo. Esse diálogo não só acontece entre as duas produções, mas em cada trabalho, individualmente, essa mesma equação aparece – do que atinge e de como se lida. A melancolia não é pejorativa, é a fidelidade com as aparições e o movimento de convívio com elas. É esperançosa. Segurem seu Maracanã.

 

Vicente Lima*

*nascido em Ribeirão Preto, é bacharel em Artes Visuais pela Universidade Federal de Pelotas, desenvolve sua produção poética partindo do olhar para situações imagéticas trabalhando possibilidades de associações entre imagem e materialidade, plano e espaço, pictórico e escultórico, que suas visualidades e contextos sugerem. Tem no currículo as exposições PRIMER - Espaço Escada. Ribeirão Preto, 2022; Programa de Exposições 2022 - Museu de Arte de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, 2022; TUBARÕES sabem da existência de CAMELOS - Corredor 14, Pelotas, 2021; 45 SARP: Salão de Arte de Ribeirão Preto - Museu de Arte de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, 2020-2021; 29 Mostra de Arte da Juventude - Sesc Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, 2019; Boas Festas - Boneco, Pelotas, 2019; Corpo que te Cabe. Centro Cultural Ordovás - Caxias do Sul , RS. 2018 e Estúdio Elledue. Novo Hamburgo, RS. 2019; Incômodo – terceira edição – Museu de Arte Leopoldo Gottuzo, Pelotas, RS, 2018-2019; 7 em Sala, primeira e segunda edição–Corredor 14, Pelotas, 2018. Te dou a minha palavra–Centro de Artes UFPEL, Pelotas, 2018. Premiado na 29ª Mostra de Arte da Juventude. É gestor do Espaço Escada, em Ribeirão Preto/SP.


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2023

_ECEU - Espaço Cultural e de Exrensão Universitária da FMUSP RP - Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo de Ribeirão Preto/SP

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DANILLO VILLA é doutor em Poéticas Visuais pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, mestre em Artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas e graduado em Educação Artística pela mesma instituição. É professor do Departamento de Artes Visuais da Universidade Estadual de Londrina - PR. Como artista, trabalha essencialmente com desenho e pintura, que se desdobram em objetos e instalações. Participa de exposições individuais e coletivas como - Sem contorno como a água - 2020 Universidade Estadual de Londrina 2020: Paisagem: sobre a repetição do que e impermanente - Divisão de Artes Plásticas, Casa de Cultura, Universidade Estadual de Londrina, 2017; Festival Camelo de Arte Contemporânea, Belo Horizonte - MG. Casa Camelo, 2016; 41° Salão de Arte de Ribeirão Preto, Nacional Contemporâneo, Ribeirão Preto – SP, 2016; Eu tentei brincar de não ser criança como você me pediu, e me fodi. Vila Cultural Grafatório, Londrina – PR, 2015. Tem trabalhos nos acervos da Pinacoteca Miguel Dutra, Piracicaba – SP e MARP - Museu de Arte de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto – SP. 


ÉLCIO MIAZAKI, artista nascido na capital paulista, é formado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (FAUUSP). Sua produção utiliza objetos principalmente das décadas de 1960 a 1980, e significa pesquisas quanto ao período ditatorial no Brasil. Aborda as Forças Armadas também nas questões que envolvem o arquétipo masculino em seus projetos de performances e instalações; Expôs em instituições públicas: DaP (Divisão de artes plásticas - UEL - Londrina/PR), Museu Casa das Onze Janelas (Belém - PA), Galeria Canizares (UFBA - Salvador - BA), FAV UFG (Goiânia - GO), GAP (UFES - Vitória - ES), Fundação Clóvis Salgado (Belo Horizonte - MG), Memorial Municipal Getúlio Vargas (Rio de Janeiro - RJ), MARP (Ribeirão Preto - SP), Centro de Cultura Ordovás (Caxias do Sul - RS), entre outras. Integra os acervos públicos da UnB (Universidade Federal de Brasília), MAC Jataí/GO, Galeria Antônio Sibasoly – Anápolis/GO. Representado pela Léo Bahia Arte Contemporânea (Vitória/ES), vive e trabalha em São Paulo.


hall de distribuição

 


ÉLCIO MIAZAKI

 

OBJETOS DE CENA #2 (série NASC.1986), 2021-2022. caderno de assinaturas, carimbos, suporte, pelúcia, acrílicos

ficha

atuação_ André Kirmayr

 

OBJETOS DE CENA #1 (série NASC.1986), 2021. máscara anti-gás, capacete PM de São Paulo, década 1970

 

VIS, 2021. letras caixa em chapa galvanizada, madeira

 

s/ título (série Socorros psicológicos), 2021. madeira

 

AME-SE (série Imperativos), 2019. letras com tinta automotiva e giz

 

O - R - D - E - R (série Imperativos), 2021. letras em madeira compensada, luminária, caixa de arquivo e pastas suspensas das décadas 1970/80

 

Radiografia #1 (série Imperativos), 2017-2018. estêncil, papel, caixa de luz, acrílico


local: ECEU -

Espaço Cultural e de Extensão Universitária

da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto

Av. Nove de Julho, 980

CEP 14025-000

Jd. Sumaré - Ribeirão Preto/SP

 

abertura: 4 de março de 2023, das 17h às 20h

período expositivo: a partir de 6 de março de 2023

horário de funcionamento: 2ª a 6ª feira das 9h às 16h30

fone: (16) 3315-0703