Impulsos Imitativos/ Shannon Botelho

Impulsos Imitativos, dá sequência a uma série de exposições no Memorial Getúlio Vargas que versam sobre a ideia de memória. Desta vez, de modo menos direto, Élcio Miazaki retoma antigos artefatos militares para estabelecer um espaço de discussão sobre as relações humanas, sobre os sentimentos e sobre a desumanização e impessoalidade impostas ao soldado em prol de uma imagem de força.

Nesta exposição, Élcio resgata elementos de outras temporalidades e insere-as numa narrativa sensibilizadora da condição de sermos humanos num mundo desigual e extremamente marcado pela intransigência do perceber-se como um ser social, inserido numa comunidade plural. Assim, fica estabelecida uma plataforma de pensamento que parte de objetos de meados do século XX, em que constem forte processo de apagamento da identidade das figuras que compõem as corporações militares. Ora, se de um lado as Forças Militares compuseram uma imagem solidificada de poder e segurança, por outro, promovem um processo de [des]pessoalização de seus agentes.

A fim de pensar estas questões, o exercício de coletar objetos antigos em feiras, lojas, barracas e tantos outros locais, levou o artista a descobrir um manual de primeiros socorros das forças armadas brasileiras, onde ainda constava um capítulo específico que orientava os soldados para executar primeiros socorros psicológicos. Esta parte, retirada do manual durante a ditadura civil-militar brasileira, é retomada por Élcio a fim de refletir sobre os aspectos que tangenciavam a vida cotidiana. Sendo assim, o uniforme, o capacete, os objetos, os desenhos, as frases e os demais trabalhos apresentados, procuram problematizar mais do que a desumanização da figura do militar, o apagamento de suas fragilidades enquanto seres humanos dotados de sentimentos, necessidades e desejos. Não se trata de mitificar a figura do soldado, como se ele fosse capaz ou incapaz de sentir e agir. Antes, paralelamente, procura-se abordar as formas de controle dos corpos contemporâneos e suas relações com o todo complexo circundante.

Impulsos imitativos opera um convite à reflexão sobre os modos de viver na atualidade, considerando que as pressões de apagamentos de identidades e de memórias seguem em curso. Como na frase exposta pelo artista, “tenha em mente que todos nós somos o produto de uma larga variedade de experiências”.

Shannon Botelho

(curador)

08/2019