sirva-se do que você quiser/ GAP/ UFES

Sirva-se do que você quiser

Esta exposição não se articula por meio de coincidências temáticas ou de linguagem. Sendo assim, a mostra pretende apresentar o olhar de oito artistas contemporâneos sobre seus próprios conceitos criativos, exibindo a diversidade de suas produções.

Vai além do acaso observar que, mesmo buscando alternativas ao uso de temáticas, a diversidade das produções reunidas nesta mostra se convergem não somente por sua contundência de expressão artística. Quando observamos em conjunto os trabalho de Carlos Pileggi, Daniel Antônio, Daré, Élcio Miazaki, Mariana Whately, Sandra Lapage, Santacosta e Thais Stoklos, verificamos que as pesquisas aqui apresentadas se debruçam, em maior ou menor escala, sobre coleta, gesto e acúmulo.

Nesse viés, a coletiva explora as relações de ressignificação e deslocamento de objetos comuns, do imaginário e do cotidiano, a fim de expandir as possibilidades de olhar esses mesmos objetos, uma vez que, para os artistas, não interessa devolvê-los para seu lugar comum. Colocando em diálogo diversas linguagens como pintura, fotografia, escultura e instalações, a exposição se propõe à criação de um espaço onde a prática e objeto se tensionam na busca da reiteração a partir da dissolução, seja da fisicalidade, do gesto ou da literalidade de sentido.

Na soma desses movimentos, Sirva-se do que você quiser confirma-se, por fim, como uma mostra dedicada a observar como os artistas lidam, hoje, com a ressignificação do sentido do que, para nós, é a apenas cotidiano: dos objetos de fácil reconhecimento aos sentimentos e intimidades que presenciamos em nossas vidas. É assim que experimentamos, de forma delicada, obsessiva, intensa, divertida, os trabalhos dos artistas aqui apresentados.

Carollina Lauriano

Sirva-se do que você quiser, é um projeto coletivo com os artistas: Carlos Pilleggi, Daniel Antônio, Daré, Élcio Miazaki, Mariana Whately, Sandra Lapage, Santa Costa e Thais Stoklos, com texto curatorial de Carollina Lauriano)

2019

Galeria de Arte e Pesquisa - UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) Vitória - ES

Posse’ é um ensaio em formato de vídeo em que são apropriadas e retrabalhadas fotos de um álbum de 1972, cuja autoria é desconhecida. Não há referência quanto às pessoas retratadas, apenas as palavras ‘Comando’ e ‘Posse’ além da data ‘10-11-72’ dividindo o espaço da capa com o brasão da República. Apesar do material ser de época em que o Brasil esteve em plena ditadura militar (há mais de 40 anos), ele gera ressignificados perante o contexto político resultante das últimas eleições de 2018. Nessa edição, a espiral da encadernação é mostrada em muitos momentos como uma metáfora de uma emenda ou costura frágil e quebradiça, de forma a não omitir como se deu o processo de edição dessas imagens. Dependendo da escala da espiral, é possível deduzir o quanto da área de imagem não é revelada. As pompas comemorativas de uma posse militar são reforçadas pelas cenas de convidados com copos nas mãos, abraços (ou 'tapas nas costas') e cumprimentos em rodas de conversa, sem esquecer das distinções de classe social. Cinegrafista e fotógrafo aparecem acidentalmente no enquadramento, uma mão desfocada em primeiro plano ganha estatus de personagem principal, e uma pessoa passa repentinamente à frente da câmera escondendo a outra que seria fotografada. Assim, vários ‘erros’ são reiterados nesse trabalho.

Em 'Servir-se de primeiros socorros', são transferidos desenhos baseados em guias de primeiros socorros do exército brasileiro em louças da mesma época. A transferência foi feita via papel carbono, mantendo o próprio substrato do material. Assim, reforça que os desenhos são 'cópias' desses guias e também gera uma ressignificação desses papéis carbonos, uma vez que alguns elementos químicos coincidem com os da pólvora. Retirados de seu contexto original, novas leituras passam a ser feitas desses desenhos, como a de corpos sendo consumidos. A escolha pelo suporte das louças, deve-se ao fato, durante o processo de pesquisa, serem encontradas porcelanas trabalhadas com motivos luxuosos com emblemas do exército e que provavelmente eram usadas pelas altas patentes.