Jornal de Estudos Espíritas - Volume 11 - 2023 

Neste artigo analisamos os três parágrafos que tratam da desmaterialização dos Espíritos, incluídos no final da introdução da Escala Espírita publicada na primeira edição de O Livro dos Médiuns. Estes parágrafos são de significativa relevância para a teoria espírita, mas em geral não são conhecidos pelo leitor espírita médio, já que constaram apenas nessa versão do texto da Escala, suprimida a partir da segunda edição do livro. O esboço de uma análise histórica e filosófica da expressão “desmaterialização do Espírito” foi construído a partir das referências, em Kardec, mais úteis para a compreensão do texto e da perspectiva espírita dualista do homem, uma versão da tese metafísica do "dualismo" entre "matéria" e "espírito" constatada empiricamente pela sobrevivência do homem à morte do corpo. No texto, Kardec associa a "desmaterialização" do Espírito ao seu adiantamento espiritual, e analisa suas repercussões no perispírito, entre as quais a ampliação de sua capacidade de percepção.

Fluido espiritual ou, simplesmente, fluido, é um conceito central na Doutrina Espírita (DE). Toda fenomenologia espírita, desde a simples ação sobre o próprio corpo material até a mais complexa modalidade de mediunidade, envolve essa substância. Manifestação espiritual é o nome dado a um fenômeno psíquico cuja causa é espiritual. Fenômenos anímicos ou mediúnicos, de efeitos físicos ou intelectuais, são manifestações espirituais. A compreensão precisa da relação entre os fluidos e as manifestações espirituais requer aprofundamento no estudo da DE. Em particular, considerado por Kardec “um dos mais importantes produtos do fluido cósmico”, o perispírito também será abordado. Tem se tornado comum confundir o que é causa e o que é efeito nas relações entre fluidos e a matéria densa e entre fluidos e o princípio inteligente individualizado. Neste artigo, uma revisão do conceito de fluidos espirituais e seu papel nos fenômenos espíritas é apresentada com base na DE. Em vista de alguns equívocos que se tornaram comuns no meio espírita, como considera-los como sendo “energias” ou “ondas”, além de serem esclarecidos com base na DE e na Ciência, a atualidade científica do termo fluido será mostrada. Esse trabalho também abrange o papel dos fluidos nos mecanismos da mediunidade e nos mecanismos do passe, de modo totalmente coerente com a DE.

Em suas obras espíritas, Allan Kardec apresentou os conceitos aceitos pelas ciências de sua época e também os resultados de suas pesquisas no campo da ciência e da filosofia espíritas. Com o passar do tempo, novas descobertas levaram à atualização dos conceitos científicos, em diversos campos. O objetivo deste artigo, assim como da sua 1a parte [JEE 9, 010205 (2021)], foi fazer uma síntese das principais descobertas e teorias astronômicas desde o século XIX até a atualidade, partindo das próprias informações históricas e científicas sobre o assunto inseridas por Kardec nas obras fundamentais do Espiritismo. Na 1a parte deste trabalho, foram abordadas as questões do espaço universal, da formação e movimento da Terra, dos mundos, das estrelas e da Via Láctea, além da pluralidade dos mundos habitados. Nesta 2a parte, outros tópicos astronômicos que também sofreram atualizações são analisados, em particular, a formação e propriedades da Lua e dos demais satélites do Sistema Solar, os cometas e asteroides, a fonte da energia solar, entre outras descobertas e concepções astronômicas dos séculos XX e XXI. Como no artigo anterior, tais dados são comparados às informações e instruções dadas pelos Espíritos consultados por Kardec e inseridas em suas obras, evidenciando que seu saber também tem limites. Na divulgação da Doutrina Espírita, então, é importante, quanto possível, incluir as atualizações das noções científicas expostas nas obras fundamentais.

A união entre os espíritas é uma condição necessária para o progresso do espiritismo e sua divulgação com mais qualidade. Desde o início do espiritismo, a preocupação em unir ou unificar o movimento espírita esteve presente como uma das mais importantes metas a se cumprir. Aliás, Kardec já se preocupava com a união dos espíritas e o futuro do espiritismo. No Brasil, onde o espiritismo floresceu e se estabeleceu ao longo do último século, embora os esforços para a união ou unificação dos espíritas, ela ainda não ocorreu de modo pleno. Em vista da importância da união entre os adeptos espíritas, este artigo se propõe a analisar a questão sob dois aspectos ainda pouco explorados pelo movimento espírita. Primeiro, reviso a proposta de Kardec para o futuro do espiritismo, destacando pontos relevantes à unificação dos adeptos. Segundo, em vista da sugestão de Kardec para a administração do espiritismo atuar de modo similar à Ciência, a forma como esta última é unificada é descrita e analisada. Em seguida, apresento um esboço de proposta de unificação espírita, com base em Kardec e na Ciência, para reflexão e uso em futuras tentativas de unificar o movimento espírita. O presente estudo analisa e enfatiza com base em Kardec, duas questões muito importantes em torno do tema: i) a importância de haver coerência doutrinária, isto é, a consciência de que não existirá unificação verdadeiramente espírita sem que os adeptos e grupos aceitem e concordem sobre os fundamentos espíritas estarem contidos na Doutrina Espírita; e ii) a importância de se valorizar a qualidade dessa concordância versus quantidade de instituições adesas ao órgão ou processo de unificação. Mostro, com base em Kardec, que a proposta de união ou unificação não deve ocorrer em torno de aspectos e qualidades morais de pessoas, grupos ou instituições, mas que a autoridade do órgão unificador deve ser, como afirmou Kardec, "em matéria de Espiritismo, o que é a de uma academia, em matéria de Ciência".

Este é o terceiro e último artigo que visa descrever a história da 5a edição de A Gênese, os milagres e as predições segundo o Espiritismo, utilizando-se das fontes documentais localizadas entre 2020 e 2021. Nos anteriores [JEE 8, 010209 (2020) e JEE 10, 010202 (2022)], descrevemos os eventos ocorridos com Kardec em vida, de fevereiro de 1868 a março de 1869, para preparar a nova edição para venda. Aqui, retomamos a história a partir da publicação da 1a impressão da 5a edição, entre abril e maio de 1869, até a publicação da 2a impressão, em 1872. Neste período, relatamos a responsabilidade e envolvimento de Amélie Boudet, tendo como pano de fundo a transição do pós-Kardec (de 1o de abril a 13 de agosto de 1869) e os primeiros anos da Sociedade Anônima (até 1873). Em seguida, avançamos cerca de 10 anos na história, para a denúncia feita por Henri Sausse, em 1884, de que A Gênese teria sido adulterada no pós-Kardec, contraditada pelas respostas dos envolvidos na publicação da obra, que esclareceram ter sido um trabalho do autor. Analisamos a repercussão dessa denúncia na França nas décadas seguintes até que, em 1925, o próprio Sausse encerrou o assunto, ao declarar que foi Kardec quem revisou e corrigiu a obra. Transladamos para o Brasil e traçamos um panorama sobre o tema, desde a tentativa frustrada de adulterar a primeira tradução de A Gênese para o português, em 1882, até a denúncia mais recente, em 2017, que repetiu a visão inicial de Sausse de que a 5a edição francesa havia sido adulterada após a morte de Kardec. Por fim, apresentamos as razões para a proposta da adulteração de A Gênese nunca ter sido de fato comprovada e demonstramos que as fontes identificadas na nossa pesquisa, juntamente com as previamente conhecidas, corroboram o testemunho dos envolvidos: Kardec é o autor da edição atualizada da obra.

No século XIX, a pesquisa e os escritos espíritas conviveram com teses e descobertas científicas diversas, como o trem a vapor, a geração espontânea, a eletricidade e o magnetismo, a telegrafia, a mecânica dos fluidos, a introdução da teoria atômica na Química etc. Em particular, no campo da Medicina, uma teoria chamada Frenologia, que pretendia relacionar aspectos dimensionais do crânio com capacidade cognitiva, ganhou espaço e adeptos. Seu escopo: explicar faculdades intelectuais e tendências humanas a partir do desenvolvimento maior, ou menor, de determinadas áreas do cérebro, perceptíveis no aspecto exterior do crânio. Allan Kardec tratou do tema em textos diversos, cuja análise permite compreender as ideias do Codificador sobre humanidade e progresso. O presente artigo, resultado de pesquisa bibliográfica, visa reunir trechos que revelam o pensamento de Kardec sobre a Frenologia, publicados na Revista Espírita; descobrir se ele aderiu ou não aos seus postulados e, em especial, compreender suas ideias sobre inferioridade e superioridade espiritual, e sobre as então chamadas “raças”.

Há no meio espírita atual, uma importante controvérsia a respeito da existência, manutenção e estabilidade das chamadas colônias ou cidades espirituais. O estímulo crescente ao estudo dos fundamentos da Doutrina Espírita incentivou o exercício da fé raciocinada, isto é, da verificação da coerência doutrinária e científica de estudos e práticas espíritas, incluindo os ditados mediúnicos novos e antigos. Há, pelo menos, dois impasses que precisam ser resolvidos ou esclarecidos para haver aceitação completa do conceito de cidades espirituais. Um deles diz respeito ao conceito de “cidade” e “ambiente urbano”. Uma “cidade” não é apenas um aglomerado de pessoas, casas e construções. As diferenças entre as naturezas da vida encarnada e desencarnada prevê conceitos diferentes para a organização social de encarnados e desencarnados. O outro impasse envolve a questão da brevidade dos objetos criados fluidicamente. Segundo a Doutrina, assim como são facilmente criados pela ação do pensamento e da vontade dos Espíritos, os objetos fluídicos facilmente se desfazem quando deixam de pensar neles. Isso, segundo alguns, impediria a existência de grandes construções espirituais que formariam tais cidades. Este artigo se propõe a tratar e propor uma solução para o segundo impasse. Apresento um ensaio teórico que explica, de modo coerente com a Doutrina e com descobertas recentes da Psicologia e Neurociência sobre atividades mentais inconscientes, a estabilidade temporal de estruturas fluídicas tão complexas quanto prédios e construções similares às que são descritas em obras mediúnicas. Mostro que processos mentais ou pensamentos inconscientes dos Espíritos seriam capazes de manter e estabilizar as construções espirituais nas quais se sentem bem e seguros. Embora o presente ensaio solucione este impasse, ele não soluciona o primeiro, isto é, ele não dá suporte para interpretações funcionais dessas construções como, por exemplo, casas fluídicas para abrigar os Espíritos das intempéries, camas e mobiliários necessários ao descanso ou lazer dos Espíritos, automóveis para locomoção dos Espíritos, jardins com atividade biológica similar à das plantas materiais, alimentação fluídica similar à material, etc.

Este artigo objetiva perscrutar a emersão dos fenômenos de "birthmarks" (sinais ou marcas de nascença) e memória extracerebral, que ocorreu em meados do século XX, na América, África, Ásia e em outras partes do mundo, chamando a atenção de acadêmicos como Ian Stevenson (1970), Hemendra Banerjee (1987) e Hernani Guimarães Andrade (2016), numa analogia às mesas girantes que no século XIX, estavam em voga e chamaram a atenção dos eruditos. O objeto de estudo é a sede da memória. Objetivos específicos: i) fazer um estudo sobre os conceitos de "birthmarks" e memória extracerebral, à luz da ciência; ii) denotar a alma, o perispírito e a sede da memória na visão espírita e iii) apresentar um caso sobre "birthmarks", do livro Reencarnação no Brasil, de Hernani Guimarães Andrade. A metodologia escolhida é a pesquisa bibliográfica e documental, de abordagem qualitativa, intencionada em evidenciar casos de crianças com idade entre 3 e 6 anos, que apresentavam marcas congênitas e emersões mnemônicas, recordando espontaneamente, como acontecia a formação dessas marcas em outra existência, quase sempre ligadas a traumas ou ferimentos, que causavam sua presumida morte. Espera-se com esse trabalho responder à seguinte indagação: as emersões mnemônicas e os "birthmarks", um fato relativamente novo, posterior aos estudos de Allan Kardec, ao rasgar o véu do esquecimento do passado, podem contradizer o pensamento de Kardec?

O presente trabalho é fruto de pesquisa bibliográfica cujo tema geral é a reencarnação, tendo como especificidade o estudo da relação entre Terapia de Vidas Passadas e o Espiritismo, tanto em seus pontos convergentes, como divergentes, objetivo primeiro deste artigo. A pesquisa iniciou-se a partir de estudos realizados pelo Núcleo de Pesquisadores Espíritas de Franca, em suas reuniões abertas realizadas nos anos de 2018 e 2019, sendo o livro Terapia de Vidas Passadas, de Brian Weiss a principal referência bibliográfica e motivação para apresentações orais em reuniões de estudos sobre o tema. Nessa etapa, foi possível compreender alguns pontos convergentes entre os estudos de referido autor e aspectos doutrinários espíritas. A metodologia da pesquisa se pauta em uma análise comparativa entre os pressupostos trazidos em obras de Weiss e os princípios básicos da Doutrina Espírita, apresentados por Allan Kardec, verificando os métodos de trabalho de ambos e as diferenças e finalidades dadas pelos mesmos ao teor de suas descobertas acerca do estudo das vidas sucessivas, ou seja, os aspectos científicos e os aspectos filosófico-religiosos da questão.

Esse artigo tem como escopo apresentar os resultados de um estudo comparado sobre a retirada ou não, da reencarnação, dos cânones da Igreja, no II Concílio de Constantinopla em 553, exclusão essa influenciada pela esposa do imperador bizantino Justiniano I, Teodora, que teria sido prostituta e abdicado da prostituição após seu casamento. O objeto de estudo é a contraposição entre a literatura espírita e a acadêmica. Objetivos específicos: i) analisar os fundamentos do conceito espírita de reencarnação; ii) conhecer o passado da imperatriz e sua importância no reinado de Justiniano I; iii) estudar o crime que Teodora teria cometido contra as rameiras, assim cosmo a maldição que recaiu sobre ela e iv) pesquisar as hipotéticas ideias de Orígenes sobre reencarnação, que teriam sido condenadas nesse Concílio. A metodologia é a pesquisa bibliográfica de caráter qualitativo, com o enfoque no estudo comparado e análise de texto. Pretende-se contrastar referências acadêmicas, como por exemplo, os escritos de Marcus Silva da Cruz e Kelly Cristina da Costa Bezerra de Menezes Mamedes (Da Cruz & Mamedes, 2014), com referências espíritas, como o testemunho de Divaldo P. Franco (2020), sobre a vida da imperatriz Teodora, se nesse Concílio a reencarnação foi mesmo suprimida do Cristianismo Primitivo e quais são as supostas ideias de Orígenes sobre reencarnação. Como resultado, espera-se estabelecer algumas semelhanças, diferenças, generalizações e individualizações.

Este artigo procura identificar e analisar como alguns literatos e intelectuais brasileiros, entre 1860 e 1930, recepcionaram em suas produções literárias e ou missivas a temática espírita a partir do seu corpus doutrinário. Muitos literatos, cuja trajetória de vida, estava de alguma forma identificada com as mesmas propostas que o Espiritismo apresentava para aquela sociedade do século XIX. Eles articularam e comunicaram através de suas obras as representações conceituais da Doutrina Espírita. Essa nova Filosofia, ao ser concebida em 1857 na França por Hippolyte Léon Denizard Rivail, conhecido pelo pseudônimo de Allan Kardec, encontrou imediata receptividade no universo literário francês e também brasileiro. O Espiritismo é uma doutrina assentada na ênfase racionalista e progressista, irrompe num momento de efervescência intelectual, oferecendo ao homem a oportunidade de compreender seu destino ao findar a vida de relação, incorporando discussões assentadas em novas bases, de caráter científico e filosófico.